domingo, 1 de abril de 2012

Brasil dá adeus a um dos seus maiores intelectuais.

“Ele nunca fazia uma piada barata” – Ziraldo.

Na última terça-feira (27), na cidade do Rio de Janeiro, morreu aos 88 anos o jornalista, dramaturgo, desenhista, tradutor, humorista e escritor Millôr Fernandes. Desde 2011 que sua saúde demonstrava cuidados, segundo declarações da família à imprensa seu falecimento ocorreu devido à falência múltipla dos órgãos e parada cardíaca. A frase que dá apoio ao título desta matéria foi dita em entrevista emocionada por Ziraldo, para o Jornal Nacional, logo depois da morte do amigo.

Millôr deveria chamar-se Milton, nasceu em 1924 (ou 1923, há controvérsias quanto ao dia exato do seu nascimento). Começou a trabalhar como jornalista aos 14 anos de idade e, em 1943 entrou para a revista “O Cruzeiro”; em 1945 ganhou o primeiro lugar em um concurso de desenho em Buenos Aires; em 1964 lançou uma revista quinzenal chamada Pif-Paf, e através dela inaugurou a imprensa alternativa no Brasil, o periódico fez oposição ao regime militar, e por isso alguns a consideraram uma revista de cunho político, infelizmente foram editados apenas oito números.

A oposição feita ao regime ajudou a consagrá-lo como uma das personalidades mais importantes da história brasileira. Essa briga continuou nos palcos com a peça “Liberdade, Liberdade” e marcou sua participação no mundo do teatro. Outra atuação marcante foi no jornal “O Pasquim”, o qual ele ajudou a fundar, embora em primeiro momento não acreditasse no sucesso do tabloide. Para o primeiro número escreveu um artigo chamado “Independência, é? Vocês me matam de rir” que terminava dizendo o seguinte: “Não estou desanimando vocês não, mas uma coisa eu digo: se esta revista for mesmo independente não dura três meses. Se durar três meses não é independente. Longa vida a esta revista!”.

O Pasquim durou de 26 de junho de 1969 (dia do seu lançamento) até 11 de novembro de 1991. Rodou o país inteiro, inclusive nas cidades do interior, que pareciam mais distantes do fervor das manifestações contra a ditadura. Em Frederico Westphalen ele também foi comercializado, como conta o empresário Marco Girardello: “O Pasquim foi algo fenomenal. Tínhamos gente que comprava, tínhamos reserva da revista na loja.” E um desses leitores é o funcionário público Sérgio Modesti, “Eu lia bastante. O meu pai viajava, era caminhoneiro, ele que me apresentou O Pasquim.”.















Sérgio com O Pasquim - antologia vol.1 e a Revista Oitenta.

Sobre Millôr Fernandes, Sérgio diz: “Lembro das frases dele bem marcantes, me lembro da frase: A vida se escreve sem borracha.”. Reiterando o duplo sentido da frase, pois a borracha era também usada pela polícia para bater em quem fosse contrário ao regime. Ainda falou sobre a Revista Oitenta, onde há uma entrevista concedida pelo Millôr Fernandes sobre trabalho, política e literatura; entrevista esta que durou mais de sete horas.

Marco Girardello não poupa elogios ao escritor: “Millôr era uma das pessoas mais lúcidas das crônicas. Nunca liguei Millôr a velho. Ele é da mesma cepa comum do Prestes, do Niemayer, são caras completamente fora do tempo deles [...] Pela qualidade do texto e do humor dele, ele fazia pensar. Ele tem o mérito de ter sido um homem além do seu tempo”.

O empresário Marco Girardello, que é dono de uma livraria em Frederico, diz que a leitura das obras do Millôr é feita por gente de todas as idades, é atemporal. Sendo “O Livro Vermelho” um dos mais famosos do autor.

Millôr presente nas prateleiras de livrarias frederiquenses.

Mas há quem discorde de que a carreira do Millôr tenha sido feita somente de brilhantismos. Nesta semana, após a sua morte foi publicado no blog Luiz Nassif Online um texto de Janio de Freitas, o qual gerou grande discussão em posts pelos leitores. E no meio dessa discussão um dos leitores chama o jornalismo do Millôr de situacionista, começa o texto dizendo o seguinte: "A propósito de uma das mais famosas tiradas do Millôr, concedo que imprensa é oposição. Mas a quê? Ao poder, público e privado, [...]".

A respeito disso, o Professor MS. de comunicação social do Centro de Educação Superior Norte-RS (Cesnors), José Antônio Meira da Rocha, declara: “O cara foi sensacional, mas no final da vida ele trabalhou para o poder. Retornou pra revista Veja no momento em que ela se manifestava de acordo com o poder.”.

FALA MILLÔR! Trechos de algumas das melhores d’O Pasquim:

A MENTIRA

“A mentira é a única verdade do mentiroso, já que, à força de mentir, ele não crê mais em nada. A mentira é uma verdade que não esteve lá. O Balanço é uma mentira contábil. A Fábula é uma mentira mitológica. O Romance é uma mentira literária. A Democracia é uma mentira política. Para se distinguir um mentiroso de um coxo basta sair correndo atrás dos dois.”. (nº 17 – outubro 1969).

ENTREVISTA (Paulo Francis, Jaguar, Sérgio Cabral e Ziraldo entrevistam Millôr Fernandes).

Paulo Francis: “[...] você não acha que a música devia ser menos importante do que um trabalho intelectual mais desenvolvido?”

Millôr: “[...] você sabe que eu e Freud achamos a música uma atividade inferior. [...] Essa coisa sensorial anterior à lógica dá no compositor popular que devia, realmente, muito bem pago, ganhar salário mínimo. [...] Agora, quando eu digo que a música é uma atividade inferior, eu digo que toda inferioridade é uma inferioridade relativa. É bom que fique claro isso. O pessoal d”O PASQUIM é um pessoal muito grosso e tende a considerar as coisas do ponto de vista maniqueísta.”. (nº 89 – março 1971).

“VIVA O HUMOR! ABAIXO O MAU HUMOR!

POR UMA DENTADURA MELHOR NUM MUNDO MAIS ALEGRE!

AOS GARNIZÉS, TUDO. AOS URUBUS, NEM A CARNIÇA.

CANJICA PARA TODO MUNDO!” (nº 94 – abril 1971).

DE CABEÇA PRA BAIXO

“Ziralod resolveu que este número deveria sair de cabeça para baixo e me pediu pra dizer por quê. Válido! Ele tem a ideia e eu explico a ideia dele. Noutro dia eu dou uma explicação para a qual ele jamais encontrará uma ideia.” (nº 104 – julho 1971).

Fonte: o histórico da vida do autor foi retirado de sua própria página na internet, Millôr Online – Enfim um escritor sem estilos.









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